segunda-feira, 24 de setembro de 2012

EUA : Lei de identidade pode barrar 750 mil eleitores


Leia matéria do Estadão:


De olho na demografia, republicanos aprovam exigência de que eleitor apresente documento
23 de setembro de 2012 | 3h 06


DENISE CHRISPIM MARIN, ENVIADA ESPECIAL / FILADÉLFIA - O Estado de S.Paulo

Dorothy Crawford, de 83 anos, esperava havia duas horas no Centro de Emissão de Carteira de Motorista de South Columbus, na Filadélfia, para renovar o documento de identidade. Sua senha mostrava que 120 pessoas estavam na sua frente. Na dúvida, ela caminhou com dificuldade até o guichê para saber se poderia ser atendida. A resposta foi "não" - e sem o novo documento, Dorothy não poderá votar na eleição de 6 de novembro.
Cerca de 750 mil eleitores do Estado da Pensilvânia enfrentam dilema similar ao dessa enfermeira aposentada. Em março, o Congresso estadual aprovou uma lei antifraude que obriga o eleitor a apresentar uma carteira de identidade com foto e prazo de validade em dia para poder votar. O registro de eleitor, segundo a nova lei, não será mais suficiente.
Nos Estados Unidos - onde não existe título de eleitor - há dois documentos que cumprem a função da carteira de identidade (o RG) no Brasil: a carta de motorista ou um documento similar sem custo, que não dá ao portador a habilitação para dirigir veículos.
Neste ano, 25 dos 50 Estados americanos adotaram legislação para obrigar o eleitor a apresentar um documento de identidade com foto ou, pelo menos, um outro uma conta em seu nome. Os Congressos locais, com maioria republicana, alegaram a necessidade de prevenir que outra pessoa se apresente no lugar do eleitor.
No entanto, para várias organizações que brigam na Justiça contra esse tipo de lei, o remédio de última hora contra essa possibilidade de fraude não passa de uma maneira primitiva de impedir eleitores pobres e idosos de votar. Como Dorothy, da Filadélfia.
"Não me lembro de ter faltado a uma eleição. Para mim, votar é um direito sagrado", afirmou ela ao Estado, zelosa do segredo de seu voto em 6 de novembro.
Truque. Na Pensilvânia, a lei sancionada pelo governador, o republicano Tom Corbett, pode ainda ser derrubada na terça-feira, quando um tribunal estadual de primeira instância deverá provar que a legislação não beneficia o eleitor.
Caso contrário, a Corte Suprema estadual deverá revogá-la, em conclusão do processo aberto a pedido da organização de defesa dos direitos civis Advancement Project.
"Estamos confiantes porque nós temos as evidências de que a maioria dos eleitores sem carteira de identidade não terá tempo para tirar a sua e porque o próprio governo estadual admitiu não haver evidência de fraude de identificação do eleitor na Pensilvânia nas últimas eleições", afirmou Richard Robinson, gerente de comunicação da Advancement Project.
"Essa legislação não é correta. Ela é exemplo de manipulação das leis eleitorais por razões políticas. É antidemocrática e antiamericana", prosseguiu Robinson.
Ele alega que a nova lei tem os eleitores negros, latino-americanos, idosos, estudantes e veteranos de guerra como alvos. A maioria desses segmentos é registrada como eleitor democrata e tende a votar pela reeleição do presidente americano, Barack Obama.
No último dia 23 de junho, o líder da maioria republicana na Câmara dos Deputados estadual, Mike Turzai, estampou com clareza que o espírito da lei é prejudicar a votação de Barack Obama.
"A lei que permitirá a Mitt Romney ser eleito na Pensilvânia está aprovada", afirmou ele, em discurso, referindo-se ao candidato de seu partido à Casa Branca.
Turzai tentou consertar sua declaração dois meses depois, ao argumentar sobre a existência de um "histórico de fraudes" nas eleições realizadas até agora na Pensilvânia.
O autor do projeto de lei, deputado estadual Daryl Metcalfe, apresentou como um benefício o fato de as novas regras tirarem o direito de voto de pessoas "preguiçosas".
Em entrevista à Rádio KDKA, na semana passada, Metcalfe repetiu uma polêmica declaração de Romney sobre 47% dos eleitores de Obama, a quem classificara de "dependentes do governo" e "não pagadores de impostos" - cuja divulgação foi considerada um desastre eleitoral até mesmo para os integrantes da campanha de Romney.
"Como Mitt disse, 47% das pessoas (nos EUA) vivem da esmola pública, longe do trabalho duro de seus vizinhos. E nós temos um monte de gente que está com preguiça de se levantar e ir tirar a carteira de identidade", disse Metcalfe. "Se esses indivíduos são preguiçosos demais, o Estado não pode consertar isso", concluiu.